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Textos de Carlos Quevedo lidos diariamente pelo actor Vitor Emanuel na Antena Um, antes das sete da tarde.

quarta-feira, 27 de fevereiro de 2008

O Senhor Comentador confia na nossa PJ para desvendar a agressão feita a um conhecido jornalista desportivo

O jornalista da SIC Rui Santos foi alvo de uma agressão feita por três homens encapuzados depois de acabado o seu programa Tempo Extra. O Correio da Manhã, com boas intenções claro está, fez um apanhado das declarações polémicas do jornalista naquela noite. Sobre Rui Costa disse: "Promoção apressada e prematura". Sem discutir a violência da afirmação, não vejo o Maestro a fazer justiça pelas próprias mãos. De Pinto da Costa: "Já não surpreende… como antigamente". Não acredito que o experimentado Presidente do FCP perdesse a cabeça por já não poder surpreender. Sobre o novo regime jurídico: "Silêncio dos clubes alimenta hipocrisia". Além de ser uma frase enigmática, isto para não dizer incompreensível, também não vejo os clubes ofenderem-se por tão pouco a ponto de mandarem mandar três matulões só para deixar de alimentar a hipocrisia. Por último, o imprudente Rui Santos afirmou: "O plantel do Futebol Clube do Porto está muito acima do Sporting e do Benfica". Esta declaração é de facto ofensiva e cruel. Mas como ficou demonstrado no domingo passado, ninguém imagina a gente do Benfica a fazer um trabalhinho que pode beneficiar ao Sporting nem a malta do Sporting fazer o mesmo pelos benfiquistas. Muito menos é de imaginar uma acção concertada entre os dois porque só beneficiaria o Porto. É, sem dúvidas, um caso bicudo. Para a nossa sorte. Contamos com Polícia Judiciária para desvendar este crime. Tenho a certeza de que desta vez os pais da Maddie não se safam. Fora isso, tudo bem.

terça-feira, 26 de fevereiro de 2008

O Senhor Comentador não percebe a animosidade contra as receitas médicas

O esforço do governo para simplificar a papelada e as deslocações a repartições estatais com a espera que isso implica parecem-me louváveis. Odeio participar nas bichas em geral. Nas longas em particular. Por isso sou um fã do Simplex em todas as suas formas e especialidades. Mas apelo ao governo para dar atenção a um pormenor que, segundo me parece, foi passado por alto. Falo das receitas dos médicos. Este pequeno papelinho tem uma importância fulcral nas nossas vidas. Ao que parece, as últimas regulamentações são impiedosas. Qualquer pormenor omitido, uma mínima coisinha rasurada ou uma data mal escrita são suficientes para que a nossa receitazinha vá recambiada para o local de origem. Podemos imaginar a angústia dos nossos compatriotas doentes obrigados a voltar a ver o médico. Ou nos casos dos pacientes impacientes mas com algum dinheiro, aqueles que são forçados a pagar os medicamentos na sua totalidade… Por amor de Deus! Desde que o mundo é mundo que os médicos se esforçam por ter a pior caligrafia do mundo. Só os nossos queridos farmacêuticos têm o curso completo de criptografia avançada, curso este que os habilitou a compreender os hieróglifos desenhados pelos médicos e nunca ninguém se queixou. O Simplex, como disse antes, é uma boa ideia. Mas, por exemplo: quantas empresas podem os portugueses fazer por dia? Quinhentas? Duas mil? Quantas receitas devem ser aviadas diariamente? Cinquenta mil? Oitenta mil? O que é que é mais urgente? Uma empresazinha que normalmente vai ir a falência dois anos depois ou um medicamento para o reumatismo que me anda a doer desde ontem? Convoquemos uma manifestação por sms para que as receitas fiquem no Simplex. Doentes unidos jamais serão doridos. Fora isso, tudo bem.

segunda-feira, 25 de fevereiro de 2008

O Senhor Comentador pede ao maravilhoso povo de Sintra que se sacrifique pelo bem do País

Os famosos voos da CIA em que se transportavam prisioneiros desde o Afeganistão, o Iraque e outras regiões pacíficas e tolerantes do mundo, estão a tornar-se um problema complexo. Não porque tenham sido realizados com o conhecimento ou a ignorância dos países em que fizeram escala. Parece-me claro que todos sabiam. Não porque se tenham feito com autorização ou sem ela. Quando se está em guerra, há burocracias prescindíveis. Não. A complexidade do problema tem forma de mulher e o seu nome é a deputada pelo partido socialista no Parlamento Europeu, Ana Gomes. Todos conhecem esta senhora de modos doces e voz cristalina e atitude moderada. Estou a ser irónico, claro. Quem ouve as declarações desta deputada fica com os tímpanos desfeitos. Ana Gomes deve ser, entre os políticos, aquela que tem o recorde nacional de indignações por minuto. Quando Sampaio confirmou Santana Lopes, logo depois de Durão Barroso abandonar as suas funções de primeiro-ministro por outro emprego mais bem pago, Ana Gomes acusou o então Presidente de pôr a democracia em perigo. Agora com os tais voos da CIA, para não se zangar com Sócrates, desculpa-o afirmando que o homem está mal informado. Está a brincar: se há uma coisa de que não se pode acusar o primeiro-ministro é de não saber o que acontece a sua volta. Ana Gomes julga que o Partido Socialista está tentar "cilindrá-la", que até se ofereceram para a propor novamente como deputada no Parlamento Europeu caso decidisse calar-se. Sinceramente, julgo que o preço do seu silêncio é demasiado alto. No fim das suas últimas declarações deixa entrever a possibilidade de dedicar a sua energia no poder local. Particularmente em Sintra que onde reside. Acho bem. Peço aos sintrenses que se sacrifiquem pelo bem do País. Fora isso, tudo bem.

sexta-feira, 22 de fevereiro de 2008

O Senhor Comentador acha que o Bloco de Esquerda fala só para as crianças

Toda a gente julga saber qual é a profissão mais velha do mundo. Mas é óbvio que antes que se profissionalizem as tais meninas, alguém deve ter ganho mais dinheiro do que todos os outros. Esse primeiro gestor com mais dinheiro deve ter sido o primeiro cliente da primeira menina que iniciou a tal profissão que se baptizou como a actividade lucrativa mais velha da história. Quero dizer com isto que o primeiro troglodita, que foi o primeiro cliente da primeira menina que inventou a profissão mais velha do mundo, ganhava mais que todos outros colegas trogloditas. Esta foi sem dúvida nenhuma a primeira desigualdade salarial registada nos primórdios da humanidade. E como naquela altura não havia carros nem cavernas com piscinas, deve também ter sido o primeiro sinal ostensivo de riqueza. Esta conclusão leva-nos a compreender que a desigualdade salarial é pelo menos umas horas mais velha que a profissão mais velha do mundo. Foi este pormenor que o Bloco de Esquerda não teve em conta na sua simpática exposição sobre os salários dos trabalhadores no Parlamento. A intervenção audiovisual que Francisco Louçã fez ontem na Assembleia da República foi simpática. Para ilustrar a diferencia salarial que existe entre um gestor e um operário, levou duas imagens. A do gestor era sensivelmente maior do que a imagem do operário, muito pequenina. Louçã explicou que era exactamente trinta vezes maior. Foi acusado de demagogia. Eu prefiro acusá-lo de pedagogia. Pedagogia é o ensino dado às crianças. Se Louçã quisesse realmente explicar a desigualdade salarial aos adultos, não teria sido tão infantil e podia mesmo ter escolhido uma imagem de desigualdade mais adulta. Por exemplo, mostrando quantos charutos cubanos (ou meninas brasileiras) um operário pode comprar com o seu salário e quantos charutos (ou meninas ucranianas) pode adquirir um gestor. Julgo que teria sido mais eloquente, mas sobretudo mais sério. Fora isto, tudo bem.

quinta-feira, 21 de fevereiro de 2008

O Senhor Comentador identificou-se com a Câmara de Lisboa

Quando soube que o Tribunal de Contas tinha chumbado o empréstimo de 360 milhões de euros que a Câmara pediu a Caixa Geral de Depósitos, juro que me vieram as lágrimas aos olhos. De repente, descobri no Município um ser humano como eu. Cheio de fraquezas e de dívidas. Cheio de boas intenções mas com problemas de subsistência tão normais nos dias de hoje. Ó Câmara, a ti te falo! Eu compreendo-te, irmã. Também eu pedi um empréstimo ao banco e disseram-me que não. Eu também sofri a injustiça da incompreensão. A minha dívida, embora não tão grande como a tua, também não foi saldada por mim. Erros meus, má gestão, optimismo ardente… Igualmente disseram-me que não ia ter nunca dinheiro suficiente para pagar sequer os juros! Insensatos! Eles não sabem que os sonhos são uma constante da vida. Que a nossa crise é conjuntural, amaldiçoada pelo destino. Mas estruturalmente somos bons e saudáveis. Ó António Costa, como te percebo. Mas não sofras: tudo se há-de arranjar. Não desistas. A Caixa Geral vai ceder. A ti, profetizo que o Presidente promulgará brevemente a nova regulamentação da lei do saneamento financeiro das autarquias elaborada pelo teu ex-governo. Assim poderás voltar a dormir tranquilo e pagar aos teus fornecedores. Peço-te que rezes por mim. Não tenho nenhuma lei que me safe e não faço ideia de como irei pagar aos meus fornecedores. Peço-te que mantenhas as ruas de Lisboa muito limpinhas. Nunca se sabe com o que é que o futuro e os bancos nos deparam. Fora isso, tudo bem.

quarta-feira, 20 de fevereiro de 2008

O Senhor Comentador reparou que a independência do Kosovo pode não ser uma má ideia

Enquanto aguardamos a recuperação de Ramos Horta, a independência do Kosovo foi a grande notícia internacional. Sabemos que tudo o que venha dessas paragens é normalmente incompreensível. No entanto, de uma coisa estamos certos: ninguém brinca nos Balcãs. Mas deixo para outro dia as análises possíveis das carnificinas prováveis. Para já, falemos do efeito dominó. Este efeito não tem nada que ver com o jogo propriamente dito. O dominó é um jogo pacífico, muito parecido com a palavra aborrecimento. Mas quando falam do “efeito”, os analistas fazem referência a essa mania de alinhar as pecinhas de um modo que quando caia uma esta faça cair a outra e assim sucessivamente. Isto é aquilo a que se chama uma "expressão metafórica". A ideia, neste caso, é a de que o Kosovo, ao tornar-se independente, outros pequenos estados podem seguir o exemplo, ou a queda, para continuarmos literalmente com o tal efeito dominó. Fiquem sossegados que Alberto João Jardim já disse que não está interessado em dominizar à Madeira. Mas imaginemos que outros povos queiram jogar ao dominó. Sem ir mais longe, os países bascos. Talvez também a Catalunha queira participar no jogo e fazer a sua própria kosovada. E com uma ajudinha, até os galegos podem gostar da ideia. Não vamos pôr de parte os andaluzes cuja costa jeitosa até dava um belo principado. Enfim, julgo que o panorama ibérico se podia tornar muito interessante com uma kosovação geral. E, finalmente, com uma Espanha kosovada, nós podíamos recuperar a Avenida da Liberdade e fazer do Corte Inglês um enorme Conde Barão. Fora isso, tudo bem.

terça-feira, 19 de fevereiro de 2008

O Senhor Comentador não está surpreendido com a entrevista ao Sr. Primeiro-Ministro

Não percebo qual é o objectivo de uma entrevista a um primeiro-ministro. Se é para que repita tudo o que disse na Assembleia, mais valia fazer um best of com os melhores momentos de Sócrates. Uma entrevista a um político tem de ser sanguinária ou então não deve acontecer. Ainda percebo menos os comentários dos jornais: "Sócrates elogia todas as políticas do seu governo". Mas o que é que esperavam? Que dissesse que se enganou com a Saúde ou que o Fisco está abusar com as medidas punitivas que executa? Que a vida está barata e andamos todos a nadar em dinheiro? É óbvio que não. Imaginem um primeiro-ministro a penitenciar-se em directo pela televisão a dois jornalistas. Queriam ouvir coisas como: "o meu governo não presta" ou "o meu governo não presta". Sejamos sérios. Sócrates esteve impecável. Só faltou dizer que ele é o melhor primeiro-ministro da história democrática portuguesa para ser totalmente sincero. Tenho a certeza de que até os jornalistas da entrevista assentariam com a cabeça, dizendo: "Não diríamos tanto, mas de facto está entre os melhores, Sr. Primeiro-Ministro". Mas a humildade do homem foi mais forte. Sócrates controlou-se. E todos sabemos que, em Portugal, a humildade é entre todas a qualidade mais apreciada. Aliás, também se aprecia muito os jornalistas que são bem-educados e não dão mostras de agressividade. Esta deve ser a segunda qualidade mais apreciada pelo público soberano. Por isso, admitamos, a intervenção de José Sócrates foi excelente. A entrevista é que não foi lá grande coisa. Fora isso, tudo bem.

segunda-feira, 18 de fevereiro de 2008

O Senhor Comentador percebe a indignação dos dois Sócrates ante a manifestação dos professores

O secretário-geral do Partido Socialista, José Sócrates, reuniu-se com mais de cem professores socialistas na sede do Partido Socialista. Mas foi o primeiro-ministro José Sócrates a comentar que não governa para obter simpatias nem para o benefício de uma corporação. Até aqui tudo bem. Já temos maturidade democrática suficiente para perceber que é natural que qualquer político a partir de certa idade, ou quando fizer parte do governo, tenha dupla personalidade. Na rua estavam umas dezenas de professores aparentemente não socialistas a protestar e a vaiar o primeiro-ministro, mas poupando, como é elementar no jogo democrático, Sócrates, o secretário-geral dos socialistas. No entanto, foi o mesmo secretário-geral Sócrates que se insurgiu contra esta manifestação inédita na história, em que militantes de outros partidos se manifestaram numa sede partidária que não fosse a própria. O primeiro-ministro tentou acalmar o secretário-geral do Partido Socialista invocando a liberdade de o povo português se manifestar, mas sem sucesso. Para mim, este incidente é normal. Só não percebi os professores que se forem manifestar. Nenhum deles sabia que organismo sindical ou quem os tinha convocado. Todos tinham recebido um SMS anónimo para se irem manifestar à porta da sede dos socialistas. A minha pergunta é seguinte: alguém pode confiar a educação dos nossos filhos a professores que obedecem a um SMS anónimo? Eu não. Mas fora isso, tudo bem.

sexta-feira, 15 de fevereiro de 2008

O Senhor Comentador está feliz com os novos avanços da medicina

Oiçam esta notícia maravilhosa: "Primeiro transplante de rim entre marido e mulher é um 'avanço' na área", diz Eduardo Barroso. Para começar, observemos que quem afirma que o tal transplante é um avanço é o Dr. Barroso, que na semana passada reconheceu ter ganho – e continuar a ganhar – uma pipa de massa por incentivar a realização de transplantes. Suponho que sempre que assiste a um transplante, o Dr. Barroso deve dizer "já cá canta mais um", "o Mercedes já está pago", "Querida, vamos ao Hawai" ou "ainda bem que já estava de olho no Bentley". Mas, pronto, ainda bem para o Barroso o futuro da medicina em geral. Continuemos com a notícia: "Primeiro transplante entre marido e mulher". Eu não sabia que isso não se podia fazer isso com a própria mulher. Não é que eu já o tenha feito. Mas como sempre estamos a experimentar coisa novas, mais cedo ou mais tarde, se calhar, numa noite de Verão, a minha mulher e eu éramos bem capazes de chegar aí. Quando li a notícia mais detalhadamente, percebi que esse tipo de transplante nunca antes tinha sido feito, não por ser pecado, mas por causa das seguradoras. Não queriam cobrir o risco do dador. E agora voltamos ao princípio. O tal grande "avanço" de que falava o Barroso, não era por causa da própria operação. Foi porque agora a seguradoras abriram um novo incentivo para os incentivadores de transplantes. Fico feliz por eles. Como diz aquela publicidade: "há coisas fantásticas, não há?" Fora isso, tudo bem.

quinta-feira, 14 de fevereiro de 2008

O Senhor Comentador propõe uma medida radical nunca antes imaginada

Corre por aí um grande chinfrim com a notícia de que Santana Lopes prestou assistência jurídica à Globalia, empresa vencedora do concurso de privatização de serviços aos passageiros da TAP. Eu só peço calma ao povo. Este episódio não se enquadra na descrição de delito de corrupção. Nem sequer é uma infracção a algum código que por aí ande. É apenas uma confusa derivação daquele famoso ditado que diz que não basta à mulher de César ser honesta, deve também aparentá-lo. E bem, Santana não aparenta é isso não é nada bem visto. Contudo, a ira popular não deve ser dirigida para o rapaz. Se existe um problema, o problema está no que aquele saudoso presidente do Sporting denunciava repetidamente: o sistema. Neste caso, nem sequer é um caso. O ex-primeiro-ministro apenas aceitou o que qualquer desempregado aceita: um tacho. Tacho este que até me atrevo a descrever como um pequeno tacho comparado com os grandes tachões que sabemos que outros ex-governantes aceitaram e, em muitos casos, até mais suspeitos. Atenção que não estou a defender o criminoso por o crime ser menor. Gostaria simplesmente de lembrar o meu querido povo que na realidade não há crime nenhum e até acredito não há criminosos nem grandes nem pequenos. E esse é o problema. Os buracos da muito mencionada, mas nunca bem esclarecida, lei das incompatibilidades são maiores do que o do ozono ou mais do que alguma mente tortuosa e esburacada possa imaginar. Não linchemos ninguém que isso não se faz. O que devemos fazer, agora que está na moda, é falar com um advogado. Com um bocado de sorte, conseguimos pôr uma providência cautelar à Assembleia da República. Fora isso, tudo bem.

quarta-feira, 13 de fevereiro de 2008

O Senhor Comentador descobriu as consequências da proposta do Arcebispo de Cantuária

Suponho que todos saibam da proposta disparatada do Arcebispo de Cantuária, Rowan Williams, de incorporar a lei islâmica, a Sharia, no sistema jurídico inglês. Julgo que toda a gente se indignou aquilo que se tinha de indignar, eu inclusive. Já não há, ou não deveria haver, pachorra para esta história do multiculturalismo e do politicamente correcto. Eu adoro estrangeiros tanto como adoro os autóctones. Quanto mais não seja, em alguns casos, por razões gastronómicas. Mas em questões religiosas as coisas podem dar lugar a oportunistas. Imaginemos um homem que prefere viver a sua juventude como cristão. É óptimo, pode beber e tal. Quando se excede nos prazeres, pode sempre recorrer à confissão. Depois, chegado o momento de se casar, pode optar pelo islamismo: a mulher passa a ficar fechada, escondida e juridicamente controlada. Quando envelhece, nosso homem escolhe uma outra religião, budista ou xintoísta, por exemplo. Tanto uma como a outra acreditam na reincarnação. O homem morre e reencarna, e tudo volta ao mesmo. Parece tão perfeito, como esses planos de poupanças que os bancos gostam tanto de oferecer. Tenho a certeza de que o Arcebispo Anglicano não percebeu as consequências da sua proposta. Não é um problema de integração religiosa. Pelo contrário, parece mais uma espécie de livre comércio da vida eterna. Fora isso, tudo bem.

terça-feira, 12 de fevereiro de 2008

O Senhor Comentador explica as regras de etiqueta às pessoas despejadas

É provável que a moda não seja exclusivo da Moda Lisboa ou do Portugal Fashion. A moda deve ser qualquer coisa como uma atitude contagiosa. Eu explico como cheguei a esta conclusão. Primeiro, foi o bastonário da Ordem dos Advogados a dar pauladas na classe política e noutras classes similares. Depois aparece o novo bastonário da Ordem dos Médicos a dar pauladas por causa do fecho das urgências. Na sexta-feira passada, a Polícia, continuando com o mesmo raciocínio, despejou à bastonada os sócios do Grémio Lisbonense. Estão a ver o fio condutor? Eu só vos digo que os bastões estão em força nesta temporada de Inverno. Claro que este elegante acessório nem a todos fica bem, é preciso ter um certo tipo de porte para ressaltar a beleza natural. Curiosamente, julgo que quem faz uso do bastão deve ter, antes de mais nada, uma certa presença; eu diria mais: alguma autoridade. É por isso que não tenho dúvidas em afirmar que se alguém nasceu para bastonário, essa pessoa se encontra na Polícia. Não quero com isto dizer que as bastonadas dadas no Grémio tenham sido justas ou injustas. Apenas digo que estavam a condizer com a ocasião social em que foram utilizadas. Quando a Polícia aparece com bastões para executar uma ordem de despejo, todos sabemos que eles não têm tempo para socializar. Assim, os protestos dos agremiados lisbonenses a querer dialogar eram totalmente despropositados naquele primeiro encontro, nada aprovados – mas de todo! – pelas mais elementares regras da etiqueta. Daí as bastonadas. Fora isso, tudo bem.

segunda-feira, 11 de fevereiro de 2008

O Senhor Comentador acha que os republicanos têm uma grande falta de chá

Não sou monárquico mas também não sou antimonárquico. Julgo que as ainda existentes monarquias europeias, todas elas implantadas em países com uma democracia exemplar, provam que os fanatismos republicanos não fazem sentido. Na semana passada tivemos o aniversário do regicídio. As polémicas em redor dessa data foram extraordinariamente estúpidas. Uma banda militar deve estar presente ou não? Como se o erário público se pudesse ressentir com tanta pompa, ou como se fosse um insulto para República que a banda tocasse na inauguração duma estátua. Aliás, concordemos que os ouvidos republicanos seriam mais bem tratados se as bandas militares praticassem um bocadinho mais. Na Assembleia grande dilema patriótico: voto de pesar pelo último rei de Portugal ou voto de alegria pela morte do gordo D. Carlos e de seu filho, já pesadote, o príncipe herdeiro? Tenhamos cuidado! O povo está observar-nos! Que medo! Deixem-me que vos diga, senhores deputados: o povo estava totalmente nas tintas para a vossa votação. Mas o mais absurdo no meio de tudo isto foi a sensação de que, de tanto dizerem "regicídio", as pessoas terem esquecido o significado da palavra. O regicídio foi um assassinato a sangue frio. Onde é que está o dilema moral? Custa tanto dizer que "bem, é bom que Portugal seja uma república, teríamos gostado que fosse de outra maneira… Enfim, ao menos não fomos tão selvagens como os franceses. Eles mataram mais… e com guilhotina, que de facto é muito feio… não havia necessidade. Sim, claro que pode ir uma banda militar e claro que toda a Assembleia tem muita pena que tudo tenha começado com tão desagradável incidente". Não custava nada, pois não? Fora isso, tudo bem.

sexta-feira, 8 de fevereiro de 2008

O Senhor Comentador elogia o candidato republicano à presidência dos Estados Unidos da América

Hoje acordei mal disposto. A minha má disposição não se deve a motivos nacionais. São as primárias americanas que estão a dar cabo do meu estômago. Todos julgamos que o próximo presidente dos Estados Unidos vai ser um democrata. Mas parece que não. Curiosamente, para os americanos o próximo presidente americano será um preto ou uma mulher. Ninguém consegue falar das diferenças ideológicas. Se Hillary ganha num estado, é porque é mulher. Se perde no outro é porque o marido se intromete demasiado na campanha. Se Obama ganha noutro sitio qualquer, é porque mobilizou o eleitorado preto ou anti-racista. Se perde, é porque é preto. Eu acho que os democratas americanos são toda uma cambada de maricas, misóginos, racistas, feministas e afro-tendenciosos. Todos eles, claro, espalhados pelo território. Por isso devemos dar valor aos candidatos republicanos, e por três razões. A primeira é a coragem de todos eles em aceitar concorrer às próximas eleições presidenciais representando o mesmo partido a que pertence o actual presidente Bush. A segunda razão é que não tiveram nenhum candidato mulher nem preto, que, como vemos, só faz confusão. A última é que os candidatos evangelistas perderam a Fé e todos eles desistiram ou quase. Aliás, os laicos também. Só fica John McCain, que é homem e branco, características mais que suficientes para ser um presidente como Deus manda. Ainda por cima tem outras qualidades como ser herói de guerra e ex-torturado, o que é uma garantia para o caso de voltar a ser capturado. Sabemos que não vai revelar nada que não saibamos. Fora isso, tudo bem.

quinta-feira, 7 de fevereiro de 2008

O Senhor Comentador declara que os controlos internos fracassaram

Em França, o banco Société Général foi lesado com uma fraude de cinco mil milhões de euros. O responsável foi Jérôme Kerviel, um puto de trinta e um anos. Escândalo. Não pelo puto, mas pelos cinco mil milhões. Como pôde acontecer uma fraude de tamanha envergadura? Depois de uma grande investigação, esperava-se uma explicação à altura dos cinco mil milhões de euros. Finalmente a Ministra da Economia francesa, Christine Lagarge, bem informada, como qualquer ministro que se preze, declara que a fraude se deveu ao fracasso dos controlos internos. Eu fiquei hipnotizado. Isto sim é que é falar. Tem a genialidade das coisas simples que todas as pessoas compreendem e, no entanto, abrange os meandros mais complexos de qualquer mecanismo. Só alguém que saiba muito, e que queira dizer só o que é preciso, diz: "Os controlos internos fracassaram". Ainda por cima, funciona com tudo o que dê bronca, seja complexo e cuja solução seja conhecida. Podem experimentar com o Benfica, os excessos da ASAE, as relações sexuais, as devoluções do IRS, o Terreiro do Paço, o Serviço Nacional de Saúde; enfim, com tudo. É muito provável que comecemos a ouvir esta frase em qualquer conferência de imprensa do governo. Aposto que Mário Lino vai ser o primeiro a utilizá-la. Por outro lado, admito, embora me pareça impossível, que a explicação da Ministra da Economia francesa se resuma à frase "os controlos internos fracassaram", porque, na realidade, não faz a menor ideia do que aconteceu na Société Générale. Nesse caso, é uma pena. Não serve. Dizer "os controlos internos fracassaram" é tão fraudulento como os cinco mil milhões que desapareceram. Fora isso, tudo bem.

quarta-feira, 6 de fevereiro de 2008

O Senhor Comentador incentiva ao pagamento de mais incentivos

Li num jornal com o título em grandes caracteres que os médicos ganham milhões em incentivos a fazerem transplantes. Este artigo condena os incentivos de certos profissionais, disfarçados de uma suposta ética superior. Eu explico. Há muitas injustiças na vida. Não ter saúde e ser feio são duas delas. Mas ganhar muito dinheiro ou ser incentivado por um trabalho difícil de realizar nunca se poderá incluir no vasto rol de injustiças a corrigir. Bons médicos e bons polícias nunca são suficientemente bem pagos nem pouco incentivados. Muita boa gente pode chocar-se com a minha inclusão de polícias na lista de incentivados. Mas se alguma vez se encontrassem com um gangue no meio de nenhures, bem podiam lamentar a falta de pessoal em tão nobre instituição. Logo a seguir pagava incentivos aos professores do ensino primário, que, no fundo, são uma mistura das duas profissões anteriores. E ainda lhes dava um bónus para cuidados psiquiátricos e mais um outro incentivo por sobreviverem aos fedelhos que tão alegremente nós concebemos. Também pagava incentivos a todas as pessoas só para ir e voltar ao trabalho, independentemente da profissão exercida. Enfim, ter pouco incentivo até é um conceito que pode ser objectivo. Basta somar os custos dos bens essenciais mais duas ou três coisinhas e resta aquilo que nos incentiva. Se não sobra nada, estamos feitos. Ganhamos mesmo pouco. Agora, estar bem incentivado é outra coisa completamente diferente: ninguém objectivamente pode afirmar a partir de quanto e fazendo o quê é que se está a ganhar muito. Com que valor merece ser incentivada uma pessoa que sabe como se implanta um fígado, ou aquela que depois de estar seis horas diárias com quarenta crianças malcriadas não comete infanticídio? Todo o incentivo é pouco. Fora isso, tudo bem.

terça-feira, 5 de fevereiro de 2008

O Senhor Comentador profetiza um apocalipse judicial

Hoje, terça-feira Gorda, ou para os pagãos, dia de Carnaval, é um bom dia para falar de uma lei que está pronta para ser sancionada e que pode, sem querer, ser o principio do caos. O Estado vai indemnizar as pessoas que sejam prejudicadas por erros ou atrasos nos processos judiciais. Assim dito, é uma óptima lei. O pormenor que se afigura apocalíptico é que o Estado, por sua vez, pode responsabilizar os magistrados responsáveis por essas decisões. Isto quer dizer que se um juiz se engana, pode ter de pagar ao cidadão uma quantia, que duvido seja pouca, pelo erro cometido. Isto traz como consequência natural que os magistrados tenham de fazer seguros para cobrir os riscos e as despesas de possíveis pedidos de indemnizações de que possam ser objecto. Por outro lado, as companhias de seguros vão penalizar procuradores e juízes que se enganam mais frequentemente. Não esqueçamos que além do engano, os atrasos também serão sujeito a indemnizações. Hipoteticamente e para falar dos casos mais mediáticos, imaginemos se todo o processo de Casa Pia fosse um erro judicial. Adicionemos a afirmação do director nacional da Polícia Judiciária, Alípio Ribeiro, que admitiu que "houve uma certa precipitação" ao constituir Kate e Gerry McCann como arguidos. Alguém é capaz de me dizer quantos zeros podem chegar a ter os cheques destas indemnizações? Só vos digo que esta lei, que até acho justa, vai levar à falência as nossas já antipáticas companhias de seguros. Esperem lá. Esqueci-me de uma coisa. Não são as companhias de seguros que vão à falência. Não interessa. Alguém com certeza há-de ir à falência. Fora isso, está tudo bem.

segunda-feira, 4 de fevereiro de 2008

O Senhor Comentador defende os políticos injustamente trucidados na praça pública

Os políticos, mesmo que ninguém acredite, são pessoas como nós. E tal como nós, têm as suas fraquezas e as suas virtudes. Cheguei a esta conclusão graças aos jornais de fim-de-semana. Vejamos o caso de Sócrates, por exemplo. O homem foi acusado de violar, desculpem a palavra, o acordo de exclusividade com a Assembleia da República por ter feito certos trabalhos quando não podia na sua condição de deputado. Oh! Grande problema! Como se alguma vez não tenhamos feito algum trabalhinho fora das horas de expediente. Ainda por cima, e é importante dizê-lo, isto aconteceu há mais de quinze anos, altura em que, nem no mais feliz dos seus sonhos, nem no maior momento de auto-estima, passava pela cabeça do rapaz que pudesse algum dia chegar a primeiro-ministro! Mesmo assim, a imprensa implacável não deixou passar este insignificante incidente. Ainda bem que a verdade veio ao de cima e o actual primeiro-ministro esclareceu que nunca tinha recebido o tal subsídio de exclusividade indevidamente. Bem feita para aquele que pensou mal e interpretou pior a declaração de IRS de Sócrates. Outro exemplo da humanidade dos nossos políticos é o Telmo Correia. Fizeram-se infames ou talvez apressadas ilações por este ter assinado 300 despachos na madrugada da tomada de posse do novo governo. Quem, pergunto eu, não ficou alguma vez na vida com trabalho atrasado? Quem, volto eu a perguntar, não fez uma directa para cumprir os prazos estabelecidos? Em vez de elogiar o empenho profissional do Telmo, as pessoas mesquinhas só falam de um ou dois despachozinhos que podem ter uma ou outra imperfeição. Qual é o significado de um, dois, vai lá, três despachos discutíveis entre três centenas? Por amor de Deus, mostrem-me um homem que não se engane e eu mostrar-vos-ei um monstro. Fora isso, está tudo bem.

sexta-feira, 1 de fevereiro de 2008

O Senhor Comentador acha que o sistema judicial parece uma piada

Paulo Pedroso colocou uma acção cível contra o Estado por ter ficado cinco meses em prisão preventiva. Pede oitocentos mil euros de indemnização. A testemunha-chave neste processo é o juiz Rui Teixeira, que, na altura, dirigia o processo da Casa Pia e deu a ordem de detenção de Pedroso. O Conselho Superior da Magistratura deliberou que Rui Teixeira ainda deve respeitar o “dever de reserva”, que é o nome queque para o popular e mal tratado “segredo de justiça”. Se bem percebi o imbróglio, a pessoa que pode provar que foi justa ou injusta a prisão preventiva daquele ex-dirigente do PS e fazer com que o Estado pague ou não os oitocentos mil euros é a única pessoa que está proibida de falar. Suponho que tanto os juízes como os advogados de Pedroso estudaram, ou deviam ter estudado na escola, que uma acção contra um processo judicial obrigaria sempre a revelar o tal segredo de justiça. Estão a ver que não saímos daqui tão cedo? A pomposidade judicial, tão ridícula que é, parece infantil. Faz-me lembrar aquela piada muito antiga em que um homem encontra um amigo e lhe pergunta:
- Onde vais?
- Ao cinema.
- O que vais ver?
- Quo vadis.
- O que é que isso quer dizer?
- Onde vais?
- Ao cinema.
- O que vais ver?
- Quo vadis.
- O que é que isso quer dizer?
- Onde vais?
- Ao cinema…
E assim por diante até que os advogados de defesa ou os procuradores se cansem de contar a história. Fora isso, está tudo bem.